domingo, 27 de junho de 2010

PÉ DO DO MORRO DE MUITAS PAIXÕES

Quando olho pra minha cidade,hoje, às vezes nem acredito, que há pouco tempo atrás,a siuação era bem diferente. Sendo ainda Pé do Morro, eu cresci como todo menino do interior. Gostava de jogar bola, bola de gude. Também empinava pipasnos outonos de ventoforte e jogava pião.
Era uma vida pacata como a de todo interior desse imenso Brasil. O sossego era a marca registrada por aqui. Não havia barulho de carros ou motocicletas. A gente brincava no meio da rua de areão ou chão batido. O arroz e o feijão trazidos das roças eram secados nas calçadas ou em terreiros de chão batido. Nas calmas tardes, homens e mulheres pegavam os kibandes e iam debulhar o feijão na porta de suas casas, sentados em tambores de madeira e couro ou então em jacás. Fumavam cigarros de palha para passar o tempo.
Quando o arroz estava pronto para consumo, as mulheres usavam o velho pilão de madeira: batiam, até o arroz se desprender da casca; depois era abanado em kibandes para limpar o ouro branco. A maior parte do arroz era armazenado dentro das próprias casas para ser consumido ao longo do ano pelas famílas.
As meninas gostavam de jogar "carimbo" no horário de recreio do velho colégio "Distrital Israel". Era um momento de grande divertimento. Algumas dessas meninas ficaram marcadas como tendo grande habilidade na arte de jogar e defender feita de meio e recheada de trapos. Dentre as mais consagradas merecerm destaque, a Marilene do finada Da Cruz, a Maria do finado Z´Contente, Rosilda, filha do comerciante Diolino, a Ivoneide da dona Dóca, Dilã, filha da dona Marli,entre outras...
Momentos inesquecíveis também foram os famosos pic-nics organizados, ora pela Ivoneide da dona Dóca, ora pelo Elias de dona Bastiana. Esses pic-nics eram bastantes movimentados. As pessoas convidadas levam alimentos e bebidas. A comida era feita em grandes panelas pretas, aquecidas por fogo a lenha. Enquanto se fazia a refeição, as pessoas brincavam, bebiam e dançavam, ao som de uma velha radiola, alcunhada de "caixa de fósforo". Havia muitas brincadeiras e namoricos. Era uma verdadeira animação em tempos que por aqui não existia luz elétrica.
Outro atrativo por aqui era o PUCUMÃ DO LIRO. Nossa praia natural. Ao longo da semana, o local funcionava como ambiente para as mulheres lavarem roupas. Elas chegavam com grandes "trouchas". Sentavam à beira d'água, numa tábua de madeira. Outros aproveitavam para pescar piaba, traíra, cará e mandi. Mas aos fins de semana, era o ponto de encontro da moçada. A água era bastante agradável e as pessoas se divertiam numa sintonia de amabilidade e sossego, sem brigas ou consumo excessivo de bebidas. Os mais ousados subiam nas árvores que ficavam no leito da lagoa e pulavam na água fazendo piruetas. As roupas debanho eram bastantes comportadas, sem sem muita ousadia.
E o CABARÉ DO MANELZINHO! era o ponto noturno da maioria dos homens. Os meninos também iam espiar o movimento. Por lá, muitas histórias se passaram: de brigas, confusões entre bebedores e raparigas,entre raparigas e raparigas, de festas dançantes e casos amorosos esquisitos e secretos. Brigas eram muito comuns nesse ambiente. Algumas delas ocasionadas por por apostas em jogos de baralhos ou excesso de consumo de cachaças. Outras eram preconizadas pelas próprias raparigas, muitas vezes, em disputas por homens que frequentavam o cabaré.
As noites de PÉ DO MORRO ainda eram bastantes animadas em tempos de festejos juninos. Na véspera de São João, as pessoas já se preparavam desde cedo para as brincadeiras. As fogueiras que iluminavam nossas noites eram ornadas com velhos e secos pedaços de madeira. Cada casa procurava enfeitar a sua. Quanto maior a fogueira, mais demorado era seu consumo. Em meio ao consumo das brasas, assava-se batata e macaxeira, movimentadas por espetos de madeira. Uma das brincadeiras era roubar batata do fogo.
As crianças aproveitavam a claridade das fogueiras para brincar de "roda", e embalavam cantigas típicas, como " melão, melão, sabiá...; sabiá bebeu, bebeu...; fui no tororó... dentre outras. Os adutos ficavam por ali proseando, contando causos do dia a dia.
Éramos muito felizes nesse período. Não havia tanto movimento como hoje. A vida caminhava sem pressa. A comunidade era unida e fraterna. Compadres e comadres, filhos e pais se davam as mãos. Fomos crescendo e aprendendo com nossas tradições e nossas esperanças de dias melhores. Sofríamos em tempos de secas, mas nos alegrávamos em tempos de fartura. O que deixamos de herança que fique registrado na lembrança de cada um que viveu aqueles áureos tempos.
Roberto Araújo de Lima.

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